Brasil

PGR defende responsabilidade de provedores de Internet por conteúdo ilícito publicado por usuários

Para Aras, atuação independe de notificação judicial e deve ter ferramentas de fácil acesso para comunicar abusos e permitir remoção célere de postagens

CONSTITUCIONAL15 DE MAIO DE 2023 ÀS 20H50

PGR defende responsabilidade de provedores de Internet por conteúdo ilícito publicado por usuários

Para Aras, atuação independe de notificação judicial e deve ter ferramentas de fácil acesso para comunicar abusos e permitir remoção célere de postagens

Foto: Pixabay

Cabe aos provedores de aplicações de Internet, independentemente de ordem judicial, observar direitos fundamentais, prevenir sua violação e reparar os danos causados por condutas de usuários não acobertadas pela liberdade de expressão, como nos casos de manifestações ilegais baseadas em fatos sabidamente inverídicos ou de conteúdo criminoso. Esse é o entendimento do procurador-geral da República, Augusto Aras, apresentado ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta segunda-feira (15), em dois recursos extraordinários (REs), com repercussão geral, pautados para a sessão da Corte na próxima quarta-feira (17).

Os recursos tratam da responsabilização civil dos provedores de Internet em relação aos conteúdos considerados ofensivos, publicados por usuários, e do dever dessas empresas de retirá-los do ar, sem a necessidade de ordem judicial. A questão é regulamentada pelo artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), o qual determina a necessidade de prévia e específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilidade civil de provedor de Internet, websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos causados por atos ilícitos praticados por terceiros.

No entanto, a constitucionalidade desse dispositivo está em debate no RE 1.037.396/SP, representativo do Tema 987 da Sistemática da Repercussão Geral. Para o procurador-geral, essa análise deve ser feita a partir da matriz jurídico-constitucional atribuída à liberdade de expressão e ao direito à informação, sem perder de vista a necessidade de preservar tais valores pela perspectiva da dignidade humana e da tutela da privacidade e da honra.

Liberdade de expressão x direitos fundamentais – Segundo Aras, embora o artigo 19 da Lei 12.965/2014 enfatize a liberdade de expressão, a partir da orientação de que não cabe aos provedores de Internet realizar indevida censura ou controle prévio de opiniões e pensamentos lícitos, deve haver exceção para essa diretriz nos casos de práticas ilícitas. O PGR defende que, nessas situações, os gestores de aplicativos atuem com os devidos cuidado e diligência para evitar que as plataformas sirvam de espaço para a difusão de conteúdos violadores de direitos fundamentais.

Augusto Aras sustenta que o ato ilícito deve ser rapidamente desfeito, tendo em vista a extrema agilidade do tráfego de informação pela Internet. Por esse motivo, argumenta que é desnecessário acionar o Judiciário em todo e qualquer caso, “como poderia dar a entender uma interpretação literal do artigo 19 da Lei 12.965/2014”. Entretanto, o PGR destaca que essa permissão para os provedores deve limitar-se às práticas sem respaldo no legítimo exercício do direito à liberdade de expressão para observar os direitos fundamentais de cada usuário e de terceiro, além de sanar ilícitos pontuais, gerados por informações sabidamente equivocadas ou vexatórias, também produzidas pelos usuários da respectiva rede social.

Por outro lado, o procurador-geral ressalta que não existe a obrigação do administrador das redes sociais de fiscalizar toda e qualquer informação que trafegue pelos perfis de seus usuários cadastrados. Segundo ele, essa iniciativa esbarraria no direito à liberdade de expressão e de opinião dos usuários, quando, por juízo próprio e sem provocação de qualquer interessado, o gestor de hospedagem excluísse dados ou censurasse manifestações legítimas dos perfis ou páginas.

Nesse sentido, Aras defende solução intermediária, que desobrigue os provedores do controle prévio e maciço das declarações legítimas, amparadas pela liberdade de expressão, mas que exija atuação conforme à devida diligência, com ferramentas de fácil acesso para a comunicação de abusos e que permitam atuação célere e eficaz para remover conteúdo sabidamente ofensivo, ilícito ou humilhante em relação a usuário ou a terceiro. Com esse entendimento, propõe a seguinte tese de repercussão geral para o Tema 987:

I) descabe ao provedor de hospedagem de perfis pessoais (redes sociais) controlar previamente o conteúdo dos dados que transitam em seus servidores; e

II) o provedor de aplicações de internet, independentemente de ordem judicial, há de atuar com a devida diligência a fim de observar os direitos fundamentais, prevenir sua violação e reparar danos decorrentes de condutas de usuários não acobertadas pela liberdade de expressão, a exemplo de manifestações ilegais desidentificadas, baseadas em fatos sabidamente inverídicos ou de conteúdo criminoso.

Fiscalização de conteúdo – Nesta segunda-feira, o procurador-geral manifestou-se no RE 1.057.258/MG, representativo do Tema 533 da Sistemática da Repercussão Geral. O referido debate também trata da fiscalização de conteúdo pelos provedores de Internet e discute o dever de empresa hospedeira de sítio na rede mundial de computadores fiscalizar o conteúdo publicado e retirá-lo do ar quando considerado ofensivo, sem intervenção do Judiciário.

Como o recurso foi interposto antes da vigência do Marco Civil da Internet, além dos pontos já apresentados para a tese de Repercussão Geral acerca da responsabilidade dos provedores de Internet, na sugestão de tese para o Tema 533, Augusto Aras acrescenta o seguinte ponto: “Em momento anterior à vigência da Lei 12.965/2014, as ofensas a usuário ou a terceiro, publicadas em perfis ou comunidades virtuais mantidos pelo provedor, hão de ser excluídas a pedido do ofendido e em tempo razoável, independentemente de específica ordem judicial”.

Fonte: Ministério Público Federal