Conheça as respostas da ciência para a doença que é tema do Novembro Azul
O Brasil deve registrar 68.220 novos casos de câncer de próstata no biênio 2018-2019, segundo estimativa do Instituto Nacional de Câncer. É o segundo tipo de câncer mais comum em homens, atrás do tumor de pele não melanoma.
A próstata é uma glândula presente no corpo do homem, localizada entre a bexiga e a pélvis. Sua função é produzir e armazenar parte do líquido que forma o esperma. Além do câncer, outras doenças comuns que atingem a próstata são a prostatite, que é uma infecção, e a hiperplasia, um aumento de volume.
Para conscientizar a população sobre a importância da prevenção ao câncer de próstata, são realizadas ações durante o Novembro Azul, em diferentes países. Tudo começou na Austrália, em 2003, quando um grupo de amigos decidiu deixar o bigode crescer neste mês e arrecadar dinheiro para apoiar ações em prol da saúde masculina. Por isso, em alguns lugares, a campanha é chamada de Movember: Moustache (bigode) + November.
E a ciência, o que tem feito pela saúde da próstata? Na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), pesquisadores estão desenvolvendo novos exames e formas de tratamento. Confira!
Nova forma de diagnóstico
No Laboratório de Nanobiotecnologia da UFU, o professor Luiz Ricardo Goulart Filho coordena uma rede com todos os urologistas vinculados à universidade e desenvolve pesquisas na área de processos e produtos para diagnóstico e terapêutica do câncer de próstata.
Desde 1997, todas as amostras de saliva, urina, sangue e biópsias coletadas em cirurgias no Hospital de Clínicas de Uberlândia (HCU), além de algumas realizadas em hospitais particulares, vão para o laboratório, que tem mais de 30 publicações científicas e seis patentes registradas.
Uma delas, de 2002, rendeu a Goulart o Prêmio de Inovação Tecnológica do Sebrae. O estudo chegou a uma forma de diagnóstico mais preciso do câncer de próstata, mas o exame nunca chegou a ser implantado no Sistema Único de Saúde (SUS).
Agora, a equipe de cientistas da UFU aguarda o resultado de outro pedido de patente, após terem tornado o exame mais simples. “Acredito que o SUS vai ter interesse, porque ele é muito rápido e mais barato. Todos os laboratórios têm as máquinas: centrífuga e citômetro de fluxo. Só precisa de duas máquinas e um tubinho para coletar sangue”, explica o biólogo, ainda sem poder detalhar o funcionamento do teste, porque aguarda o resultado do pedido de patente.
O resultado do exame fica pronto em três horas. O custo para os pesquisadores é de cerca de R$ 100 por paciente, mas com a implantação em larga escala na rede pública de saúde, Goulart acredita que o valor será bem menor.
Para que o exame chegue até a população, após o registro da patente, deve ser feito o registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a submissão ao Conselho Temático de Inovação e Tecnologia (Cointec), a avaliação em um outro laboratório público e o estudo de implementação. “Isso demora muito tempo para política pública, mas para os laboratórios privados, uma vez registrado, eles podem comercializar”, afirma Goulart.
Esse estudo que chegou ao diagnóstico mais rápido e barato do câncer de próstata começou em 2007 e foi feito em parceria com a empresa Biogenetics, que recebeu recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e investiu na pesquisa da UFU.
Influência da obesidade
Já faz um tempo que os cientistas descobriram que a obesidade é fator de risco para câncer de próstata. Faltava entender o que acontece na vida dos homens obesos que favorece o desenvolvimento desse câncer. É isso que a bióloga Daniele Lisboa Ribeiro, do Instituto de Ciências Biomédicas da UFU, investiga há oito anos.
Durante o doutorado e o pós-doc, Ribeiro constatou que existe uma grande proliferação celular estimulada pelo ambiente obesogênico. “Só que, quando eu fui apresentar isso no exterior, eles me levantavam os mesmos questionamentos: ‘ah, legal, muito interessante, mas quais desses ambientes são os mais propensos a desenvolver tumor?’ E eu não sabia, porque o obeso tem vários ambientes alterados”, recorda a pesquisadora.
São exemplos de ambientes obesogênicos o excesso de lipídios (gorduras) no organismo, as alterações hormonais, como diminuição de testosterona e aumento de estrógeno e de insulina, e a ocorrência de inflamações provocadas por alterações das citocinas, um tipo de proteína relacionada ao funcionamento das células.
No laboratório da UFU, esses ambientes são simulados in vitro (fora do organismo) com células tumorais humanas de próstata para que se investigue quais deles têm maior predisposição a estimular a proliferação celular. “A gente percebeu que todos eles são altamente estimuladores”, afirma Ribeiro.
Os ambientes que mais provocaram o aumento de células tumorais foram a presença de insulina e a hiperglicemia (excesso de glicose), mais do que aqueles com excesso de lipídios, o que surpreendeu a bióloga.
Os resultados desse estudo indicam caminhos multidisciplinares para o tratamento do câncer de próstata. Segundo a pesquisadora, “é um olhar que agora os médicos urologistas vão ter que ter no tratamento desses pacientes. Não só tratar o câncer, mas também buscar uma melhoria na alimentação e [controle] no ganho de peso”.
Biomarcadores e formas de tratamento
O Laboratório de Genética e Biotecnologia (GBio) do Campus Patos de Minas tem se dedicado à caracterização de biomarcadores – modificações biológicas que indicam função normal ou patológica de um organismo – e ao desenvolvimento de novas formas de tratamento contra o câncer de próstata.
Coordenado pela professora Thaise Gonçalves de Araújo, o grupo conta com doutorandos, mestrandos, alunos de graduação e apoio técnico para o desenvolvimento das pesquisas. “Já foram descobertos genes-chaves, cuja expressão se altera com o desenvolvimento do tumor, ocupando compartimentos celulares diferentes e, portanto, mudando sua função com o desenvolvimento da doença”, explica a bióloga.
O laboratório também testa formas de tratar o câncer de próstata. “Conhecendo o papel de um oncogene específico [gene que favorece o desenvolvimento do tumor ao inibir supressores tumorais], o grupo testa alternativas para a degradação desse gene, para, assim, garantir o bom funcionamento das células”, afirma Araújo.
Em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora, o GBio da UFU também testa diferentes compostos extraídos de plantas do cerrado. Segundo Araújo, o Brasil tem aproximadamente 25% da biodiversidade mundial, mas somente 15% foram estudados e 2% caracterizados. “Por isso o uso sustentável desses recursos naturais é uma grande oportunidade de desenvolvimento econômico, sobretudo na área de fármacos. Ensaios iniciais em células já estão sendo finalizados, com o início do teste em animais projetados para o próximo ano”, diz a pesquisadora.
comunica.ufu.br